sexta-feira, 24 de junho de 2011

White Material



Fico fascinado sempre que um diretor, no caso diretora, consegue recortar espaços de tempo e contar suas histórias dentro deles, sem que o público sinta necessidade de saber o que está além na trajetória de seus personagens. Claire Denis consegue fazer isso muito bem. Seu filme é composto por uma série de fragmentos que se misturam e se separam com o decorrer do filme. O que importa é o que está na tela no momento, não o que passou o que virá a seguir.

“White Material” não conta exatamente uma história, mas seu enredo é trazido para o palpável através de um lugar sem nome na África, que está em situação de guerra. A miséria humana e a subversão do conceito de pátria são os reais fios condutores do filme, onde a narrativa literária funciona muito mais como uma forma de fazer o público acreditar no que vê. O que realmente nos faz imergir no universo de Claire Denis é a forma sensorial como ela coloca seus planos. A câmera inquieta ofega e observa tudo, elevando os instintos do expectador.

Tempo e espaço não tem importância alguma, só servem para tentar fazer com que entendamos o que é impossível entender. “Coisas de branco” como moral, certo e errado são postas como irrelevantes em um lugar onde a linha entre o racional e irracional é quase invisível. Os personagens são complexos demais para serem movidos apenas por coisas banais, como a cobiça. Denis consegue tocar em pontos fortíssimos sem fazer julgamentos. Sua direção é delicada, inspirada e assustadoramente humana.

A fotografia e a trilha sonora tornam tudo cru. Dançam juntas formando a beleza do horror. As locações remetem a qualquer lugar, que é ao mesmo tempo muito específico. O filme poderia estar acontecendo em qualquer parte do continente africano, mas é ali que nos é mostrado. São naquelas estradas e plantações que tudo funciona.

O elenco é encabeçado pela diva Isabelle Huppert, que consegue brilhar com ou sem maquiagem, provando mais uma vez o seu talento a muito inquestionável. Sua personagem, Maria Vial, é a administradora de uma plantação de café, que resiste em meio à guerra a fim de salvar aquilo que julga ser seu. Maria ama e pertence aquela terra, mais do que a França de onde veio. Enquanto seu filho, vivido pelo competente Nicolas Duvauchelle, nasceu em solo africano, mas não pertence a lugar algum.

Escondido na casa de Maria, o lendário “boxeador” é procurado por todos. É ele quem motiva jovens revoltosos que desde cedo foram renegados pelo seu lar. São órfãos, abandonados, que viram seus pais morrerem e sua terra ser tomada por outros. Exalam liberdade, ao passo que estão presos ao seu fardo, por não poderem usufruir do lugar que lhes foi reservado no mundo.

A fluidez com que Denis nos dá suas imagens torna essa uma experiência única. “White Material” é o tipo que filme que pode ser vaiado e aplaudido na mesma proporção, dependendo do ponto de vista que se tem sobre ele. Minhas mãos não se manifestaram. Desde que o vi o ar parece mais pesado, e a consciência de existir, uma cruz que terei que carregar até o meu último suspiro.

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